O rei D. João VI esbanjou saúde ao longo da vida. Além de ser conhecido como glutão, não perdia um só evento real, comparecendo sempre que possível. No início do seu último ano de vida, entretanto, a saúde do rei contrastou com seu conhecido fôlego, adoecendo gradativamente e sendo visto em raras aparições públicas.

No início de março de 1826, D. João apresentou diversos problemas de saúde, desde vômitos, colapsos nervosos e até desmaios, durante vários dias. A pedido do próprio pai, sua filha, Isabel Maria, ficou ao seu lado, responsável por sua saúde e qualquer emergência imediata. Na noite do dia 9, as dores intensificaram, resultando em sua morte durante a madrugada, com 58 anos de idade.

O choque de seu falecimento repentino iniciou uma série de suspeitas sobre a causa de sua morte, desde atribuições ao seu estilo de vida, ao local que morava e, principalmente, a possibilidade de sabotagem. Internamente, a casa do rei atribuía a causa, principalmente, a um conhecido desafeto de João VI, sua esposa, Carlota Joaquina.

O casamento desastroso

Ao longo do casamento, Joaquina se recusou a aderir ao papel de esposa submissa, o que era costume na época. A união, nesse ritmo, foi desastrosa: as brigas e discussões levaram o casal a adotar um comportamento frio e distante. Se viam somente por obrigação protocolar, durante reuniões oficiais.

Enquanto isso, aos olhadores do povo, a rainha parecia ter uma atitude promíscua para influenciar o cônjuge a favor das ambições da coroa espanhola. Entretanto, a má fama da “megera de Queluz” pode ter sido nada mais do que uma campanha de difamação contra seu poder feminino.

Tais fatores atribuíram a Carlota a morte do rei, embora isso não tenha sido especulado na época, mas disseminado como ação conspiratória dos opositores à monarquia e aos funcionários reais. No entanto, recolhida em Portugal, Carlota apenas lamentou a morte do rei e cooperou para a continuidade da faixa, passada para a filha Maria Isabel provisoriamente, até a nomeação de D. Pedro I.

Os restos mortais de D. João VI

Apesar da suspeita de sabotagem, não havia equipamentos e soluções disponíveis para uma maior averiguação da causa de sua morte, sendo pouco comentada em pronunciamentos para a população portuguesa e brasileira. Seu corpo, entretanto, foi embalsamado, com parte de suas vísceras exumadas em um pote de cerâmica chinesa.

O mistério sobre a morte de D. João VI
Do Museu Nacional de Arte Antiga (Portugal), a tela de Domenico Pellegrini (1805) retrata dom João como príncipe regente

Buscando maiores conclusões em relação ao falecimento de João VI, uma equipe de pesquisadores teve acesso aos restos mortais no ano de 2000 e, com auxílio de análises digitalizadas, os cientistas identificaram uma letal quantidade de arsênico, edificando a possibilidade de um assassinato ou suicídio do monarca português.

Para chegar a esta conclusão uma equipa multidisciplinar, coordenada pelo arqueólogo Francisco Rodrigues Ferreira, analisou as vísceras do rei, que se encontravam num pote, enterradas no chão da Capela dos Meninos da Palhavã, do Mosteiro de S. Vicente de Fora.

A sintomatologia descrita pelo cronista Frei Cláudio da Conceição, que acompanhou a doença súbita do monarca, já deixava a suspeita de que algo estranho se passara e que a utilização de um veneno era plausível.

Falta saber quem terá sido responsável pelo envenenamento. Tratou-se de um reinado difícil marcado pelas guerras napoleónicas, guerra civil entre liberais e absolutistas, disputas políticas, matrimoniais e familiares intensas que influenciaram de forma decisiva a sucessão dinástica.